Duas semanas de produto, usuário de CRM, alguma apresentação de clientes… e a partir do primeiro mês já começamos a cobrar pipeline, forecast e fechamentos. Quando, depois de seis meses, os resultados não chegam, a frase aparece rápido: “não era tão bom quanto parecia”. Eu acho que a pergunta incômoda é outra: estamos realmente fazendo um onboarding coerente com o tipo de venda que queremos?
Na venda consultiva B2B, onde os ciclos podem levar vários meses, falar em onboarding de 15 dias é se enganar. A integração pode ser curta, mas o onboarding comercial deveria cobrir pelo menos os primeiros 3 a 6 meses, com foco em fazer o vendedor entender o negócio, o cliente, o processo comercial real (não o teórico) e a cultura de trabalho. Nesses primeiros 90 dias, para mim a ordem é simples: primeiro observar e escutar (como a empresa realmente ganha dinheiro, quais dores reais o cliente tem, como hoje são vendidas as oportunidades que de fato fecham); depois praticar acompanhado (conduzir partes da reunião, fazer perguntas, combinar próximos passos com alguém da casa ao lado dando feedback); só então começar a soltá-lo com determinados tipos de contas, com um gerente atuando mais como coach do que como fiscal de números.
Há outro tema do qual quase não se fala e no qual muitas empresas regionais batem de frente: o salário e a parte variável durante esse período. Se pedimos venda consultiva, com ciclos longos, mas desenhamos o plano de comissões como se fosse varejo, criamos uma tensão enorme. O que vejo funcionar melhor é proteger parte da variável nos primeiros meses, atrelando-a a marcos de aprendizagem e atividades de qualidade (pipeline qualificado, bom uso do CRM, reuniões relevantes) e não apenas à faturação, além de definir metas crescentes e objetivos coerentes com o ciclo real de venda. A mensagem para o vendedor muda completamente: “sabemos que tipo de venda estamos pedindo e vamos medir você com a régua correta”. A ansiedade cai, a qualificação melhora e a qualidade das conversas com o cliente sobe.
Não acho que o problema seja apenas “não encontramos bons vendedores consultivos”. Muitas vezes, o problema é que colocamos essas pessoas em um jogo complexo como se elas já conhecessem o clube, a tática e o campeonato, e ainda por cima as julgamos pelo placar do primeiro tempo. A pergunta que gosto de deixar para as equipes de direção é simples: se amanhã entrar um novo vendedor consultivo na sua empresa, ele tem um onboarding desenhado ou vai ter que se virar sozinho? A resposta diz muito sobre o seu modelo comercial… e sobre o quanto você está cuidando do talento que tanto custa atrair.